Por Flávio Calife e Bruna Martins
A macambúzia situação da economia brasileira ainda parece longe do fim. As projeções para o Produto Interno Bruto (PIB) já apontam queda de 3,8% para 2016, o mercado de trabalho segue cambaleando, as taxas de juros e de inflação devem continuar em patamar elevado e o tão esperado ajuste fiscal…ficou para algum momento imaginário.
Os desdobramentos deste cenário não são poucos e agravam cada vez mais o desempenho das empresas, colocando-as em xeque. A queda da atividade econômica leva à redução das receitas, ao mesmo tempo em que o aumento dos juros, dos preços e dos impostos elevam os custos. A combinação de receitas menores com custos maiores pode gerar um fluxo de caixa deficitário para as empresas, provocando em alguns casos inadimplência e, na pior das hipóteses, levando até mesmo à falência.
Os números corroboram esse diagnóstico preocupante. A taxa de inadimplência das empresas com recursos livres do Banco Central começou sua escalada no início de 2014 e de lá para cá aumentou 1,67 p.p., atingindo 4,73% em fevereiro de 2016. Essa elevação foi tão abrupta que reduziu a diferença entre a inadimplência dos consumidores e das empresas de 2,47 p.p. para 1,47 p.p., revelando que neste momento as empresas encontram-se mais vulneráveis que os consumidores.
O indicador de Falências e Recuperações Judiciais da Boa Vista SCPC, outro número alarmante, mostra que 2016 começou mais pedregoso que o ano anterior.
No acumulado do 1º trimestre, os pedidos de falências aumentaram 31,6% em relação ao mesmo período do ano anterior, em 2015 o resultado foi de queda de 5,8%, na mesma base de comparação. No trimestre, o setor de serviços foi responsável por 40% das falências, seguido pela indústria (34%) e pelo comércio (26%). Entretanto, a indústria foi o único setor que ganhou representatividade no período, após crescer 46,6%.
Quando analisados os pedidos de recuperação judicial, neste ano a alta no trimestre foi de 165,7% e no ano anterior havia recuado 15,2%. Com crescimento de 184,7% no trimestre, o comércio representa 43% dos pedidos de recuperação, seguido pelos serviços (31%) e pela indústria (26%).
Com isso, as empresas encontram-se diante de um dilema para sobreviver. Ou se endividam mais para resolver seus problemas de caixa ou cortam seus custos, reduzindo sua capacidade de entregar produtos e serviços.
A primeira opção, aumentar o endividamento de curto prazo, visa suprir a diminuição das receitas. Embora a trajetória do saldo de crédito para pessoas jurídicas seja de queda, algumas modalidades do rotativo começaram a ser mais utilizadas pelas empresas. Mesmo com os juros maiores, essas linhas pré-aprovadas e consideradas emergenciais, como cartão de crédito e cheque especial, tornaram-se mais requisitadas devido à facilidade e praticidade na obtenção do crédito.
O cartão de crédito – rotativo e à vista – atingiu 11% das concessões de fevereiro classificadas como rotativas. Este percentual era de 9,9% em fevereiro do ano anterior. Realizada a mesma comparação no saldo, a mudança foi semelhante: passou de 6,1% para 7,5%. Na comparação interanual, o saldo com cartão de crédito rotativo vem crescendo em torno de 25% e cerca de 8% para o cartão de crédito à vista.
Apesar de fácil essa alternativa traz problemas. O aumento recente da inadimplência das empresas e o atual cenário econômico contribuem para a elevação do risco da carteira. Como os concedentes continuam seletivos e boa parte de seus recursos migraram para Tesouraria, esse risco maior só inibe a oferta de crédito e aumenta ainda mais os juros finais. À beira da insolvência, o crédito mais caro pesa na hora da decisão das empresas.
A segunda saída para equilibrar o orçamento seria reduzir custos. Com o baixo nível de vendas, as empresas encontram dificuldade na hora de arcar com os custos fixos e optam por reduzi-los a fim de poupar algum suspiro. Aparentemente, essa opção tem sido a mais utilizada, e a vítima maior nesse caso é a mão de obra.
Em um ano, a taxa de desemprego pulou de 6,8% para 9,5%, segundo Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad). Com a oferta de emprego bem abaixo da demanda, a renda real recuou 0,2% no acumulado em 12 meses e esta tendência não deve mudar no curto prazo.
Com menos renda e menos emprego as famílias freiam o consumo, que, por sua vez, impacta diretamente no resultado das empresas. Sem perspectiva de mudança de curto prazo no rumo da política econômica, ainda é possível que este círculo vicioso se intensifique mais. As más notícias parecem ilimitadas e as soluções para as empresas cada vez mais escassas.
(*) Artigo originalmente publicado pelo site do IBEF (Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças de São Paulo) em 20 de abril de 2016.